quinta-feira, 7 de agosto de 2008


ATUALIDADES:
Estou em Gramado. Mando notícias.

Nunca esteve tão difícil ganhar dinheiro. Infelizmente minhas atividades, teatro e cinema, têm que ser subsidiados. São, no mundo inteiro. Com exceção dos Estados Unidos. Que sendo o país mais esperto do mundo, há mais de cem anos sacou que esta porra dá dinheiro, a cultura. Aqui não. Duzentos anos se passarão antes que nosso dirigente tenha a inteligência e a tranqüilidade suficientes para considerar a arte uma coisa útil. Os dirigentes, como os russos chamavam o Estado, são via de regra, porque não usar a palavra exata, burros. Burros imediatistas. No momento em que ascendem ao poder, esquecem o que foram fazer lá. E preocupam-se apenas, dedicam todo o seu tempo, em manter-se lá. Ou seja, arranjar verbas para o próprio cargo, para a própria instituição que comanda. De modo que está difícil ser artista no Brasil. Ganhando dinheiro. É preciso ter um certo nível como pessoa para compreender que a arte é necessária socialmente, essencial, e por isso, protegê-la. Difícil compreender que isso não passa de uma mínima obrigação de qualquer homem público. A realidade é essa, convenhamos. Vivemos politicamente abaixo do nível. Por mim, é preciso redescobrir um caminho que já tive muitas vezes. Exercendo uma atividade, ganhando patrocínios, humilhando e concedendo tudo o que é necessário, etc... Mas por outro lado, manter uma segunda atividade depende somente de mim. Esta é uma atitude de sobrevivência para qualquer ser pensante. Tô doido pra criar não mais o BOAA (Baixo Orçamento, Alto Astral) mas o filme ou a peça “Zero”. Auto-sustentável, se necessário, mais barato que os BOAA. Calcula-se a bilheteria possível e daí se deduz o orçamento. Para depois procurar pessoas que topem trabalhar assim. O orçamento será de 2 vinténs. Se forem bons artistas, ótimo. Senão, foda-se. O importante é fazer. Para não morrer de medo ou velho. O teatro é o último reduto da inteligência livre. É preciso prezar isso.
Vi “Copélia”. Fui levar as netas. Nunca tinha visto um ballet, nem no Teatro Municipal. Fui de avô, convicto. Eu também penso que nunca tinha visto Copélia. Das moças bailarinas, com sua feminilidade como não existe mais, sempre gostei. Aquele salto pirueta sempre tive vontade de dar. Mas fora isso, sempre achei muito chato o ballet clássico. A não ser pelo virtuosismo dos seus maiores intérpretes. Gostei da Copélia. Vantagens da idade avançada, curti valores que não tinha curtido antes. O ballet clássico desse tipo não é uma criação. É sempre uma recriação. Uma obediência à tradição. Disse Brecht: “Uma peça deve ser feita exatamente do mesmo modo que ela vem sendo feita nos últimos 2000 anos. Mesmo que tenha sido escrita ontem.” O ballet tem esse tipo de grandeza. Mesmo os bailarinos do Teatro Municipal que, segundo consta, são um bando de funcionários públicos invejosos e fofoqueiros, tomam ali, em meio à Copélia, o Estado de Graça da arte. Não há dúvida de como surgiu aquela arte. A culpa é dos passarinhos. Se uma alma boa, e os pássaros também, por que não os homens? A dança é uma atividade de protesto contra uma inexorável e repressora força: a força da gravidade. Quero escrever um ballet para a Debora Colker. Onde os bailarinos dancem palavras, frases, pensamentos, estórias, aventuras. E que a palavra pareça música e que a música, ela mesma, apareça apenas nos clímaces. Porque, afinal, música não é mais que a palavra, ela mesma, destilada nos tonéis da profundidade, voando assim por cima da inteligência, gerando a consciência nos céus da própria alma humana.
PASSADO:
PAPÉIS SOLTOS
25 ANOS
... tenho vergonha de qualquer análise do sofrimento por que é o sofrimento que me envergonha. Uma vez feita a escolha de viver ou meter uma bala nos cornos, ou pular destas janelas sempre tão perto, perde-se o direito de sofrer, sendo assim, como reage ante o fim do mundo quem sabe que o mundo já acabou?
... O mundo é belo. Esta verdade é tão inegável quanto estas minhas mãos, que batem com raiva na máquina e que eu gostaria de amputar. Por que não o suicídio? Por que não fazer deste sol que me fere a vista, o derradeiro? No dia em que eu morrer, a humanidade acaba. Canso, torno-me um ser sem músculos. Morrerei enfim?

(Já separado da Eliana, fiz minha primeira peça amadora. 25 anos. Chamava-se "Sétimo Ceu", adaptação de um dos mais românticos filmes mudos. A verdade é que sempre gostei do Teatro)

...Estou há doze dias da minha primeira estréia!
G. desce um pau em quem falar mal de mim. De vez em quando canso insuportavelmente desta gente barulhenta de teatro.
Comprei uma garrafa de piper.
Devo adaptar minhas peças para o cinema, me livrando assim, definitivamente, do teatro.
Por que não consigo nunca escrever teatro e sim tetaro? Como M. fica bem de calça comprida e blusa amarrada.
Preciso me curar do parasita que tenho nos pés, apanhado num chinelo de meu pai (Não me curei até hoje)

JÁ CASADO COM LEILA
26 ANOS, provavelmente.

Num caderno antigo encontro o telefone do Passarela...
Hoje de manhã quis muito ter meu passado de volta. Quis que Leila fosse Eliana, que seu Álvaro ainda estivesse vivo, que fossemos todos e passassemos slides.

Flashback da infância.

Quando eu era menino, uns 10 anos, meus pais tinham uma casa em Petrópolis, na rua Marquês de Paraná, 125. Havia 4 quartos. O meu variava, dependendo das pessoas que estavam hospedadas. O quarto de meus pais tinha uma varanda. Eu tinha asma. Na casa ao lado morava o Clarêncio, irmão da Clarice, por quem me apaixonei (eu me apaixonava sempre). No alto da rua havia a casa das meninas, moravam muitas lá. No jardim dos fundos tinha uma grande horta, que depois foi acimentada para fazer uma espécie de quadra de basquete. Costumávamos correr do portão até a garagem, apostando quem chegava primeiro. Havia uns quartos também em cima da garagem e era uma grande liberdade dormir lá, com os amigos. Na casa em frente morava o Alberto, que era mais velho, tinha um pai engenheiro que jogava cartas com meu pai. O Alberto de vez em quando organizava jogos de monopólio, mas não gostavam que eu jogasse porque eu era criança demais. No jardim do Alberto havia uma pequeníssima piscina onde me lembro que um dia caí.

Não há nada mais chato que um sonho. Não significam nada, nem para quem sonha. Qualquer dia alguém escreverá um livro muito importante chamado “A Interpretação dos Sonhos”. Na verdade, ainda não foi escrito esse livro. Freud apenas ensaiou.

Já adulto, sonhei com a Marquês de Paraná. As casas eram altas, no sonho, e as calçadas muito estreitas. Quando saí de casa, o ônibus quase me atropelou. O ônibus corria, quase perdendo o equilíbrio nas curvas e ameaçando destruir-se contra as casas. Eu sabia porém que o resto da cidade permanecia belo e largo e meu maior desejo era levar Leila para passear e conhecer Petrópolis, mas ela não queria ir. Preferia ficar jogando buraco com minha avó e minhas tias.
Nos meus tempos de dar festas em casa (dei muitas) brincávamos de muitos jogos, inclusive de "passar o anel" - sensualíssimo entre adultos.

4 comentários:

Anônimo disse...

Finalmente uma reflexão sobre música. Quando a isso de achar que todo mundo está louco para se entregar ao dirigismo senão "foda-se", é provável que muitos selecionem a segunda opção.

Anônimo disse...

Oi Domingos, sou eu a Dani que vai pra España. Passei pra deixar um beijo, eu tinha escrito um comentário meio grande, então resolvi aumentá-lo mais ainda e te mandei por e-mail.
Parabéns por Gramado,
um beijo,
Dani Barbosa.

Anônimo disse...

Parabéns por Juventude!
Quero muito, muito ver!
Beijos, Helaíne.

Anônimo disse...

Domingos, meu velho, bacana à beça o teu blog. Já te linkei no meu. Cara, é possível te enviar um texto de um espetáculo meu que está em cartaz aqui em SP? Grande abraço, Jarbas Capusso Filho

jarbascapusso@uol.com.br


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