terça-feira, 28 de setembro de 2010

Carta Aberta ao Ministro Juca Ferreira

O próximo Ministro da Cultura... Provavelmente vai continuar sendo VS, que não conheço pessoalmente mas que me parece um homem digno e vigoroso. Inteligente. Corajoso. É bom que seja tudo isso porque terá de enfrentar muitos desafios internos que são os mais duros de vencer. O Ministro teria de fazer um exercício de humildade. O que é dificílimo, quando se está no poder, porque pode ser interpretado como fraqueza. O Ministro terá que se desfazer de muitos preconceitos e conceitos anteriores sobre o cinema. Mas creio que VS tenha a estatura espiritual e humana necessária. O Ministro terá de compreender que toda política cinematográfica repousa em princípios errados herdados de outros governos menos democráticos.
Não tentarei argumentar: essas Leis estão aí há muito tempo. O resultado é
que
95 a 99% dos filmes brasileiros não se pagam. Portanto, as Leis que
estão aí, embora há muito tempo, não funcionam. Isto é inegável! É preciso
criar novas. Baseadas em princípios mais fecundos. Quero dizer, será preciso o Ministro tomar para o Ministério todo o dinheiro do incentivo fiscal, que está longe de ser pouco, para que ele, o Ministério, formule uma política inteligente para a grande catedral do cinema brasileiro. Não temo que uma linha de conduta deste porte conduza ao dirigismo ou a um excesso de Poder do Estado. Se por acaso acontecerem estas coisas, combateremos e acabaremos com elas. Os perigos de uma idéia não podem fazer com que desistamos dela, se for uma idéia certa. Inteligência e grandeza não nos faltam, enquanto nação. Mas a verdade é que estamos fazendo talvez o pior cinema da América Latina. Por quê? Por quê, Ministro?
O Ministro terá de compreender que a importância da indústria
cinematográfica é determinada pela qualidade dos filmes que se faz. E longe de mim querer referir-me à qualidade técnica. Esta é um adorno que vem como conseqüência. E longe de mim querer medir filmes pela bilheteria que fazem. Isto seria indecente. Refiro-me à qualidade Artística. Ou melhor dizendo, a necessariedade do filme. Somente com filmes de conteúdo, não contingentes, balançaremos a estrutura do mercado interno a ponto de entreabrir suas portas, assim sempre foi e sempre será. É o artista. É ele que fará a mudança. A revolução. Talvez estivessem com a razão nossos predecessores que tinham o Ministério de Educação e Cultura. Cultura faz parte da Educação. É ineficiente pensar uma separada da outra. E Cultura não é Arte. A medida da Arte é a importância humana do filme, sua capacidade de melhorar vidas, é o principal. Sua capacidade de melhorar vidas! Daí nasceu tudo e para aí deve tudo regressar.

O Ministro terá de colocar em segundo plano o “industrialismo”, o cinema que almeja apenas divertir e ganhar dinheiro, alcançando todas as classes sociais, em outras palavras, dar ao povo o que ele quer. Para um produtor independente, isto é perfeitamente válido. Para o Governo, uma atitude indecente. O Governo deve dar ao povo não o que ele quer, mas o que ele precisa. No nosso caso, as lições da auto-estima, do caráter, da ética, da solidariedade, da cidadania, das boas relações humanas, enfim, da Arte. A Arte é a locomotiva, este é o desafio que o Ministro terá de enfrentar. Um desafio espiritual. Como isto pode ser conseguido? Ele saberá responder. Eu sou apenas um artista.

Não clamo por um Ministério da Arte. Gostaria, mas sei que estamos longe disto. Este da Cultura está bom, se não pensarmos que é a menor verba da União.

O Ministro deve resolver muitos problemas sérios. Vai ter que colocar a imaginação no poder e ser razoável, pedindo o impossível, como os estudantes de Paris em 68... Negar muita coisa em que já acreditou. E crer em novas.

O filme brasileiro tem de se pagar no mercado interno. Para isso os métodos estão apontados. Reserva de mercado, adicional de renda e principalmente apoio à iniciativa privada, o respeito ao dinheiro de risco, no sentido do reembolso do capital (se o filme for bom, é claro). Mas acho que na verdade o papel principal do Ministro será convencer seus patrões e sua turma da importância social da Arte, que Cultura não é Arte, que não vale a pena um país como o Brasil fazer filmes. Temos muitas outras prioridades. É preciso que o Brasil faça filmes bons. Que a Arte é necessária para a identidade e a moral do país. A Cultura é passado, Arte é futuro. O Ministro atual, que, espero, será o próximo, tem estatura para compreender estas aparentes sutilezas.

4 comentários:

Anônimo disse...

Querido Domingos,parabéns sempre,abraço carinhoso,
Celso Vieira de Carvalho
www.casadaipiranga.blogspot.com
casadaipiranga@yahoo.com.br

Anônimo disse...

Domingos,
Você foi preciso! Existe um política de quantitativos: "nunca na e(his)stória desse país se fez tantos filmes!"O grande problema é a qualidade, a estética, a arte e o refinamento. Vamos oferecer novas cores ao nosso meio artístico. Ou ficaremos sempre na perspectiva de rã?!

Alex Rocha,Salvador-BA

alvo de fora disse...

Não sei como você consegue manter-se idealista depois de tantos anos. Confesso que eu, beirando os 30, sou menos esperançoso...

Abraços,
Alvo de Fora!

Luriana disse...

Olá, Domingos.
estou aqui mais uma vez para dizer-lhe o quanto você é um gênio e todas essas coisas que se sabe sobre você. Mas então, eu gosto muito dessa sua visão política, é sempre bom tratarmos desses assuntos, ainda mais se tratando de arte.
Mas, é muito bom também quando você escreve sobre a vida, as coisas. Assim como aquele poema "a vida é uma puta". Queria pedir-lhe, enfim, como sua leitora assídua do seu blog, que escreva sobre tudo isso. Quero relatos sobre a vida, sobre músicas, sobre o mundo, a infância, os amores perdidos, os amores encontrados. Eu já agradeço, sou a Luriana, de são luis-ma, tenho 18 anos. E quero saber sua visão sobre a vida, e tudo mais que já falei aqui. E parabéns, desde de já!
abraços