terça-feira, 5 de agosto de 2008



James Mason, a voz mais bonita do cinema, em "Dead Men Out", grande filme inglês de Caron Reed, que nunca consegui plagiar. Mas ainda conseguirei. Raridade, não existe em video.
ATUALIDADES:

Um Poder que Não Entendo

Continuo fazendo aos sábados o meu show. É um trabalho estranho, esse show. Tudo bem com sua proposta. Alta informalidade, repertório curioso, etc. Mas até hoje eu, que sou organizadíssimo em todos os trabalhos, não consigo organizar isso. Como se a bagunça fosse parte essencial do show. Enfim, está melhorando, mas até agora, nesta temporada tem sido espetáculos ruins. A gente canta mal, eu falo mal, a gente nunca sabe o que vem depois, ou seja, uma debilidade mental generalizada. E quando acaba o espetáculo, e mesmo durante, é bem claro que a platéia delira de prazer! Mesmo quando não está cheio. O espetáculo tem uma magia que não dá pra entender. Não é que as pessoas gostem, elas ficam agradecidas, encantadas, apaixonadas! E certamente eu não mereço tanto. Toda a equipe e meus amigos dizem que esse fenômeno tem vários motivos: O encanto de toda a equipe, o alto lance das cantoras, nossa cara de pau, ou melhor dizendo, auto-estima, ou melhor dizendo, liberdade e falta de culpa de errar tons, etc. Mas que o principal é o meu “carisma”... Reconheço que deve haver qualquer coisa assim, mas que porra é essa, o carisma? Quê que eu faço que é tão engraçadinho? Reconheço que as filosofias são hábeis e que tenho uma preocupação nobre de integrar-me o mais que possível com a platéia. Sentir-me como parte de um todo, espectadores e eu num mesmo instante e espaço, iguais. Enfim, reconheço que sinto bastante bem o “lado de lá”. Porém, enquanto isso, esqueço o texto, falo embolado, gaguejo... e no final sou tratado como um guru, ser especial, qualquer coisa assim, não entendo, não entendo. Gostaria que quem está lendo essa mensagem desesperada apareça no show e me explique o quê que é isso. A juventude, então, particularmente as meninas, me adoram! Não sei se como avô, como artista – mas será que me adoram mesmo? Elas dariam pra mim?




Preciso fazer uma mala direta das pessoas que seguem meu pensamento, minha cabeça é um turbilhão, um maremoto infernal. Porém, como não para, segue. Para cima. Porque para baixo dói muito. Dos grandes prazeres da vida quando você encontra alguém que tem por divertimento seguir seu pensamento. Como se anda por uma estrada. O dia em que eu conseguir fazer a mala direta dessas pessoas, serei um vencedor. Mas a timidez não permite que eu faça. Deveria haver uma secretária para isso. A delicadíssima Tati Muniz se oferece para descobrir quem são os meus seguidores. Esperem por seu email. Ou ofereçam-se para a lista.


O maior prazer de um artista é que vejam a sua obra. Maior que esse só existe um prazer: de que sigam a evolução de seu pensamento. Compare o atual com o anterior, descubra diferenças... em outras palavras, que façam com o autor aquilo que se faz com um namorado ou um filho. Uma pessoa amada. Uma vez descoberta esta tribo, saberei que não estou sozinho. E caminharíamos todos sem olharmos uns pros outros, em direção ao mar. Ouvindo uma música de Nino Rota no ar num novo eterno filme de Fellini...


Aceito a oferta da Tati. E mais, os voluntários que se apresentem para a lista.


PASSADO:

13/3/61
(24 anos, casado com Eliana há uns 3. Creio que casei aos 21. Casamento em plena decadência. Quem quiser entender melhor, "A Primeira Valsa". À venda nas boas livrarias.)



Resolvi levar adiante meus impulsos: trair Eliana a qualquer preço ou custo. Eliana me acusa de não ser "autêntico", odeio esta palavra. Anteontem tive de interromper meu diário subitamente e ontem não o escrevi. Hoje preciso escrever, senão acumula demais. Fazia um calor impressionante e eu estava imundo, louco para ir ao banheiro. Cheguei em casa às 5h, médico às 6h (psicanalista). Aflito para encontrar o telefone da Beatriz no catálogo, mas Eliana estava em casa. Me senti malíssimo e entrei no banheiro sem catálogo. Fiquei lá o tempo mínimo para por para fora o que me sobrava, peguei o telefone e telefonei.
No início gaguejei, depois assumi aquele ar paternal ridículo que uso ultimamente para me relacionar com as mulheres. Com Eliana sou tão inseguro. A verdade é que não tenho nenhuma razão para me sentir inseguro diante das outras mulheres. Também Cecília e Beatriz não são inteligentes. Não gaguejei propriamente: hesitei. Disse que a maior diferença entre o Domingos de hoje e o que ela conheceu, é que este é mais sincero, sem rodeios. Convidei-a para sair, alegando que tinha curiosidade de conhecê-la, que não tinha nenhuma idéia de quem ela realmente era. Tive a impressão de que ela não entendeu o que eu quis dizer. Não tive boa impressão sobre a inteligência de Beatriz. Pedi também a ela que não fizesse nenhuma cerimônia de recusar, usando a mesma sinceridade com que eu tinha feito o convite. Repeti pelo menos duas vezes que não sabia se ela tinha namorado, noivo, ou mesmo se era casada (sabia sim: o telefone era da casa dos pais dela).
Afinal pedi a resposta: podia ou não sair comigo. Ela disse: "Agora posso". Uma voz débil, fina, suave, mas quase inaudível. "Afinal você teve importância na minha vida". Para continuar a conversa embaraçosa, ela disse que outro dia tinha se lembrado muito de mim porque tinha visto o Ítalo Rossi, que ela achava parecido comigo e que estava estudando biblioteconomia ou bibliotecologia.
Perguntei então se ela podia sair comigo hoje. Ela disse que hoje não, muito nervosa. Que não podia, que ia sair depois da aula. Tive a impressão exata que era mentira. Achei que ela queria ir ao cabelereiro antes, ou que estava com uma espinha, coisa assim, então marquei para o sábado. Sábado é o pior dia, mas eu já tinha ido longe demais, não podia parar. Sábado para homem casado é quase impossível.
Não quero mais escrever hoje. Estou muito frio quanto ao que estou narrando e isto não é verdade.

Li o diário de Eliana, a primeira parte. É belíssimo. Belíssimo. Isto me incentivava para continuar escrevendo o meu. Joaquim chegou.
Fui obrigado a dedicar a primeira parte do dia inteiramente ao Joaquim. Ele está muito ruim, plena neurose. Almocei com ele. Eliana preferiu tomar banho e almoçar depois. Fizemos hora e fui com ele ao oculista. Joaquim perdeu os óculos.
Depois de deixá-lo tive um acesso de improdutividade. Passei na Feira do Livro, depois parei na Ladeira do Leme, estudando o ambiente para meu filme. Amanhã escreverei à máquina, minha mão me dói. De manhã fui ao analista discutir meus problemas sexuais.
São 4 da manhã. Venho, com Eliana, de longa permanência com Joaquim, coisa habitual agora. Temo que Joaquim se mate. Gostei da aula de Teatro!




ENCANTAMENTOS

(Quando me apaixonei pela mulher de um amigo, uma grande paixão, que não anotei nunca, porém apenas mais uma emanação do citador furor juvenil diante da C.E. )

Eu te olhava, você de um, eu do outro lado. Se você me olhava, eu tirava os olhos, não aguentava. Aí, sua miserável, você passou a não me olhar mais. Olhávamos para todas as outras pessoas. Nunca um para o outro. Era um jogo encantado, sabíamos mesmo sem querer saber, que naquela sala cheia só existíamos nós dois e a música.
Ataquei. Prendi meu olhar na tua direção, mas tentei não te ver. Os olhos fora de foco, como se eu estivesse pensando em mim! Você resistiu, ah, como você resistiu! Mas acabou me olhando, trêmula, como se eu tivesse deixado de te amar! Mas se eu te amarei para sempre. Vencedor e agradecido, fixei sem defesas meu olhar no teu. Por um momento cumprimentamo-nos, com vago sorriso. Ninguém percebeu. Teria sido mortal se alguém tivesse percebido.
Era de novo minha vez. Um vaso de flores perto de mim. Pequenas e amarelas, as flores. Botei uma entre os dedos e iniciei uma discussão absurda sobre um assunto qualquer, com alguém. A discussão tomou calor, era assim que eu queria, mas a flor não saiu dos meus dedos. Não olhei pra você, tentei (e até consegui!) ignorar tua presença. Você vingou-se imediatamente, entabulando uma conversa com D. sobre cães e gatos. Senti que era o momento exato! Mudei de poltrona e deixei a flor ao lado do cinzeiro. Instantes de ansiedade, mas quando olhei, te vi em minha poltrona, com a flor entre os dedos. Obrigado, te amo, te amarei sempre!
Foi então que P. tirou você para dançar e eu pus outra dose em meu copo e Jacques Brel começou a cantar. P. é meu únco rival verdadeiro, sei disso, era melhor que eu ignorasse o fato de você estar dançando com ele! Só que não pude controlar-me. Comecei a marcar o ritmo da música, estalando os dedos levemente. Depois, com deliberação, diminui o ritmo e quando olhei para teus pés, vi que eles obedeciam a mim, e não ao Brel, então tive menos ciúme.
Ó amor! Logo deixarei de te amar! Mas antes é preciso que você seja minha e que eu seja seu! Possuir você me faria imortal!

(E foi então, que separado da Eliana, um dia descobri esta maravilha que é o Alcool. Lembro que bebi uns dois anos. Dormia uma noite, bebia dois dias. Os apartamentos acabaram, eu tinha dois, me mudei para o Bairro Peixoto e foi mais ou menos assim que Leila me encontrou. Talvez 26 anos?)



Essa moça da flor tem a minha idade. Somos amigos até hoje. Ou melhor, a mesma velha ranzinza e rejeitada continua encantadora. Não temos mais muito assunto. Ela chama-se, mentirei aqui, Lívia. Ainda não contei na minha obra o meu tórrido caso com ela. Era mulher de um amigo meu.

8 comentários:

Anônimo disse...

Oi Domingos,

sempre leio seu blog, pra me sentir mais pertinho de você, e hoje me deu muita vontade de responder a sua pergunta. Portanto, eu acho que o Cabaré dá tão certo, pela única razão de ser feito com muito amor, por sua parte e de todos que o fazem. Amor, essa é a única resposta. Você emana amor pro universo, e ele te devolve. É só isso!
E nós as meninas, te amamos de verdade, não importa como, se como avô, mestre, artista. Eu pelo menos te amo, porque acredito em tudo o que você diz!
Muito obrigada pela entrevista concedida à mim e a meu amigo inglês. Foi muito especial pra mim, poder te ouvir numa tarde tão linda, na sala da sua casa, com tanta generosidade.
Te escreverei da Espanha, pra te contar as experiências novas que surgirão na minha vida.
Um beijo,
Dani Barbosa.

Anônimo disse...

Oi Domingos, quero sim participar da mala direta!
O seu espetáculo é maravilhoso por tudo isso que você descreveu. Talvez até pela desorganização.

Meu email: joema@telecine.com.br

beijo,
Joema

Anônimo disse...

Ofereço-me também para a mala direta. Sou de São Paulo, então não pude ver ainda o espetáculo. Quando vier para cá (tomara que sim) estarei na estréia.
Acompanho tuas reminiscências também, principalmente as do Anglo Americano, onde você e meu pai, Arnaud, estudaram juntos. Abraços.

Anônimo disse...

DOMINGOS,
PARABENS PELO BLOG, SE VC ESTIVER EM SAQUAREMA NOS DIAS 06/07 DE SETEMBRO VÁ VER MINHA PEÇA A COMEDIA 'O INOCENTE INUTIL' COM JOAO CARLOS BARROSO, SILVANA CALABRIA, FELIPE RUGGERI O GAROTO MULTI VOZES, DIREÇÃO DE LUIZ MAGNELLI. TEATRO MUNICIPAL DE SAQUAREMA
ABRACOS /Romulo
r_monro@ig.com.br

Anônimo disse...

ADOREI ler seus comentários auto-críticos e muito bem humorados. RI muito, obrigada! Se as meninas dariam? Essas meninas de hoje dão mesmo, vc não tem idéia, o mundo tá muito rodado nelas... Dão e não se doam, e nem se doem, e não têm elas a menor noção do que estão fazendo... rs rs rs rs Gostaria de entrevistá-lo para a minha coluna na revista americana Scene4 international magazine of arts & media ( www.scene4.com) Estou lá quase todo mês, nesse agora não, mas estou nos arquivos. Um bjo e nos conte mais, dos passados e dos futuros! Andrea Carvalho Stark
agrinalda@gmail.com

Anônimo disse...
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Anônimo disse...

Impressionante como a reflexão só passa pelo ego. Não tem música no show?

fmaatz disse...

Esse troço tá cada vez melhor. Achei um livro seu num sebo e com dedicatória. Tenho até medo de ler. Teu otimismo é um troço que me instiga e desafia. Sou tipo reclamão e velho aos 27. Porra. Isso tudo pra dizer: continue, continue.